Proposta 4 Fortalecer a participação e o controle social

A participação e o controle social, tanto na definição de diretrizes, regras e políticas de infraestrutura quanto no ciclo de obras específicas, são requisitos fundamentais para o controle da corrupção e para a gestão dos impactos ambientais desse tipo de empreendimento.

Funcionam, na prática, como salvaguardas para que os projetos e as políticas públicas em geral sejam bem desenhadas, desenvolvidas e implementadas. Com a posição e as necessidades de todos os grupos envolvidos, haverá mais informações e subsídios para uma melhor tomada de decisão. A criação de espaços públicos de debate diminui as chances de as decisões sobre infraestrutura serem capturadas por grupos de interesse, por vezes pouco comprometidos com a manutenção da qualidade ambiental.

Incorporar a perspectiva dos grupos potencialmente mais afetados por determinado empreendimento é um caminho importante para que as decisões políticas sejam mais equilibradas e, possivelmente, mais justas. Também proporciona um espaço de diálogo, de negociação e de minimização de conflitos podendo, inclusive, diminuir a probabilidade de judicialização, atrasos e custos adicionais. O controle social de contratos públicos, de investimentos e da implementação de condicionantes ambientais ajudam na prevenção e na detecção do mau uso ou mesmo do desvio de recursos. Isso porque, muitas vezes, é o cidadão ou uma organização da sociedade quem identifica e denuncia atos de corrupção.

Apesar da existência de mecanismos como conselhos, audiências e consultas públicas, persistem lacunas e problemas estruturais que precisam ser superados para que os benefícios da participação dos vários grupos da sociedade envolvidos em megaprojetos de infraestrutura de fato ocorram.

Em nível federal, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e o Conselho Nacional de Secretários de Transportes (Consetrans) possuem papel importante na discussão de políticas ambientais e de infraestrutura. Porém, o CONAMA teve o espaço de participação da sociedade recentemente reduzido, o CNPE possui apenas dois representantes da sociedade, que são indicados pelo poder público, e o Consetrans é composto somente por agentes públicos.

Consultas e audiências públicas são previstas em alguns momentos do ciclo de infraestrutura, incluindo decisões das agências reguladoras e antes das licitações. Algumas limitações desses processos dificultam o acompanhamento detalhado por quem não tem conhecimento especializado. E, mesmo quando a sociedade civil encaminha sugestões, geralmente há baixa consideração das propostas recebidas na decisão final e falta de justificativa para essa recusa.

Já no processo de licenciamento ambiental de obras específicas, são realizadas audiências públicas para discussão do EIA/RIMA. Trata-se de um espaço importante, mas insuficiente, dado o seu caráter pontual, sendo muitas vezes o único espaço formal de apresentação de dúvidas, críticas e sugestões.. Isso somado ao caráter geralmente técnico e pouco inclusivo das audiências, faz com que seja necessária a ampliação da participação no debate sobre o licenciamento.

No momento de implementação da obra, não existe a previsão de instrumentos de participação ou mesmo mecanismos claros de prestação de contas, inclusive sobre a execução das ações de mitigação e compensação de seus impactos socioambientais. Isso diminui o espaço de diálogo entre a sociedade civil, empreendedores e agentes públicos, além de dificultar ações de monitoramento e controle social.

Também não há instrumento legal que assegure a participação social na gestão dos royalties gerados por parte destes empreendimentos. É comum que tais recursos acabem gerando disputas políticas, desvio de finalidade ou mesmo corrupção nos municípios que recebem estas compensações financeiras.

Por fim, por serem geralmente os grupos mais impactados pelas grandes obras de infraestrutura da Amazônia, os povos indígenas e as comunidades tradicionais devem ter garantida uma participação plena e irrestrita nos processos decisórios. Isso vale tanto na definição de diretrizes e políticas de infraestrutura quanto no ciclo das grandes obras específicas que atingem diretamente seu modo de vida. A Consulta Livre, Prévia e Informada,prevista na Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT, deve ocorrer ainda na fase de planejamento das obras e antes das decisões sobre a concessão, a licitação e a emissão das licenças ambientais.

Nesse sentido, apresentamos as seguintes recomendações para fortalecer a participação e controle social:

Ampliar a participação da sociedade nos conselhos

Aumentar a participação nos conselhos nacionais, tais como CONAMA, CNPE e Consetrans, garantindo maior equilíbrio entre o número de representantes do governo e da sociedade civil, bem como a definição autônoma das organizações e indivíduos que representarão a sociedade.

Elaborar novas estratégias de participação na fase de planejamento

Criação e aprimoramento de instrumentos de participação em todos os planos setoriais de infraestrutura, bem como na fase de avaliação de viabilidade econômica e de planejamento de obras específicas.

Aperfeiçoar audiências e consultas

Aprimorar as audiências e consultas públicas relacionadas a políticas, normas e obras de infraestrutura, bem como o seu processo de licenciamento ambiental, garantindo-se: a divulgação ampla e prévia de sua realização, prazos e formas de participação; a disponibilização prévia e integral de todos os documentos e produção de materiais resumidos e em linguagem acessível; as condições adequadas e equilibradas de manifestação dos diferentes grupos interessados; o apoio à participação de grupos em situação de vulnerabilidade e daqueles potencialmente mais afetados pelas decisões; a apresentação de justificativas sobre como as contribuições do público foram consideradas no processo decisório.

Criar mecanismos de participação em cada obra

Criação de uma instância permanente de participação e controle social em cada grande obra, para a qual empreendedores e governo devam prestar contas sobre a sua implementação, bem como os investimentos públicos e privados relacionados às medidas de mitigação e compensação. Essa instância deve contar com apoio técnico e jurídico para realizar ações de monitoramento independente, bem como com representantes dos grupos mais afetados pelo empreendimento.

Garantir o direito de participação dos povos indígenas e comunidades tradicionais

O processo de Consulta Prévia, Livre e Informada para povos indígenas e comunidades tradicionais deve acontecer antes da tomada de decisão sobre grandes obras de infraestrutura e respeitar os protocolos de consulta comunitários, garantindo-se, assim, que esses processos sejam adequados às suas características socioculturais. Deve-se garantir, também, a participação dos povos indígenas e comunidades tradicionais em espaços de planejamento de políticas de infraestrutura e de gestão ambiental.

Estabelecer mecanismo de controle dos recursos de royalties

Criação de mecanismos específicos de controle social dos recursos de royalties, como conselhos de políticas públicas e orçamento participativo, buscando garantir que a sociedade possa participar mais ativamente das decisões sobre a destinação e do monitoramento da aplicação desses recursos.